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Não conserto coisas

Não conserto coisas. Não sei consertar quase nada e nem me interesso em fazê-lo. Nenhuma justificativa intelectual, moral ou psicológica para isso. Pareço agir de acordo com algum código de ética interno segundo o qual é questão de princípio não consertar coisas. Elas quebram e praticamente gritam para mim: “NOS CONSERTE!”. Mas eu as ignoro.

O QUE QUEBROU FOI O MEU CHUVEIRO. A RESISTÊNCIA DEVE TER QUEIMADO. NENHUMA IDEIA DE COMO SE TROCA UMA RESISTÊNCIA, NENHUMA DISPOSIÇÃO PARA APRENDER. Cheguei da rua, abri o guarda-roupas e todas as camisas haviam caído. O trequinho que segura a madeira na qual penduramos os cabides havia quebrado. Bastava comprar outro e pregá-lo na parede do móvel. Então, tirei todas as camisas dos cabides e as levei para a sala, onde as enfiei na prateleira de baixo de um pequeno armário que uso para guardar os meus livros, enquanto não compro uma estante. Tive que desocupar essa prateleira, claro. Por isso, os livros e dvds que ela sustentava foram transportados para a parte de baixo de um rack, já apinhado deles. Está claro que o rack não vai aguentar por muito tempo o peso dessa carga extra. Dou uma olhada todos os dias, quando chego do trabalho. Até agora, ele ainda não quebrou.

O que quebrou foi o meu chuveiro. A resistência deve ter queimado. Nenhuma ideia de como se troca uma resistência, nenhuma disposição para aprender. Passei a tomar banho frio, violência a qual nunca tinha me submetido antes. No início, entrava na ducha gelada e começava a urrar igual a um fuzileiro naval de filme de guerra americano executando exercícios militares. Agora já consigo suportar a temperatura e me comportar de modo mais digno.

Pelo menos os banhos ficaram mais curtos. A torneira da pia do banheiro quebrou. Uma bobagem, me disseram. Basta trocar a carrapeta. Não sabia o que era uma carrapeta. Não quis saber o que era uma carrapeta. Não quis aprender como se troca uma carrapeta. Fechei o registro e passei a abri-lo toda vez que preciso fazer a barba, tomar banho ou lavar a louça. Enquanto o registro fica aberto, a água jorra, num desperdício ultrajante se você considerar todas essas campanhas de preservação da água. Por isso, os banhos mais curtos.

Daí que outro dia fui ver The Book of Eli, filme horroroso no qual Denzel Washington vaga por um planeta desolado por uma catástrofre climática. No filme, a água é o bem mais escasso e mais disputado pelos humanos. Fiquei culpado. Mas não consertei a torneira ainda.

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6 Comentários

  • RespondaMelissamaio 24, 2013 at 1:50 pm

    já fui assim, logo que me mudei e fui morar sozinha. Passou. Aprendi. Comecei a fazer. Me senti poderosa. Me senti bem, ótima! Aprender coisas novas, como me virar e como resolver sozinha as coisas, enfim, ser independente, é amadurecer, crescer. Ser.

    Corra atrás disso. A vida muda.

    • RespondaApezinhomaio 24, 2013 at 7:46 pm

      Oi, Melissa. Obrigado pelo toque. Sim, você tem razão. Uma das boas coisas de se viver sozinho é justamente ter que aprender novas maneiras de lidar com as coisas do dia a dia e consigo mesmo, né? Já sei me virar bem melhor agora. É que esse post era mais uma reminiscência dos meus primeiros dias sozinho, um pouquinho exagerada pra parecer mais engraçado e tudo. Não é tão sério. Beijos, Leandro.

  • RespondaMelissamaio 28, 2013 at 5:09 pm

    levei a sério… rsrs pois já passei por isso também…e acabo levando algumas coisas a sério… como o blog tem a proposta de ensinar e ajudar, não entendi como uma “sátira”…

    como o que a gente escreve, influencia… eu resolvi comentar rsrsr. Fiquei pensando, que infantil!!! Esse precisa correr atrás! Mas como a sua idéia foi fazer um texto engraçado.. desculpe-me, eu nao tinha entendido a proposta!

    beijos! ;)

  • Respondakarinejulho 23, 2013 at 10:15 am

    Muito fácil arrumar todas essas coisinhas, deixe juntar várias coisas para consertar e faça uma lista delas para não se perder, e quando você tiver um tempo para ficar em casa chame um marido de aluguel que faz tudinho!!!!

  • RespondaHugo Fsetembro 15, 2013 at 10:50 am

    Me identifiquei totalmente, a diferença é que pago alguém, sempre preços extorsivos para consertar tudo ou espero o Pereirão, minha mãe, consertar quando ela vem me visitar.

  • RespondaBrunamaio 27, 2014 at 2:24 pm

    “Enquanto o registro fica aberto, a água jorra, num desperdício ultrajante se você considerar todas essas campanhas de preservação da água. Por isso, os banhos mais curtos”.

    Gênio. Amei o estilo do texto, o sarcasmo e humor sofisticados. Mais textos do Leandro, por favor! :)

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