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Vamos falar de amor?

Em junho de 2016, a bela Flávia, amiga muito querida e estilista de moda de sua própria marca, dedicou sua coleção ao amor. Ah, sempre ele!

Ela convidou seus amigos a escrever livremente sobre o sentimento ou indicar trechos de textos preferidos que melhor o definiam.

As frases selecionadas foram celebradas em estampas e transformadas em lindas peças de roupa. O lançamento do projeto aconteceu em nossa livraria do coração (olha ele aqui de novo!), a Argumento, em uma noite muito especial.

Gostamos tanto do que vimos e ouvimos, que pedimos pra ela nos “emprestar” os textos selecionados.

Esperamos que eles toquem você. Coisas do coração sempre (re) mexem, desvendam e emocionam. E relembram o porquê de viver!

A Flávia hoje está no céu das pessoas muito especiais.

Repostar esse texto em data tão especial é o nosso jeito de mandar um beijo bem amoroso para ela.

Viva o amor!

***

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NA PRAIA – Quando pensava nela, parecia-lhe surpreendente que tivesse deixado aquela garota com seu violino ir embora. Agora, é claro, via que a proposta recatada que ela lhe fizera era totalmente irrelevante. Tudo aquilo que ela precisava era da certeza do amor dele, e da sua garantia que não haveria pressa, pois tinham a vida pela frente.  Amor e paciência – se pelo menos tivesse conhecido ambos ao mesmo tempo – certamente os teriam ajudado a vencer as dificuldades.

É assim que todo o curso de uma vida pode ser desviado – por não se fazer nada. Ele não sabia ou não teria querido saber, que, enquanto ela fugia, certa na sua dor de que o estava perdendo, nunca o amara tanto, ou mais desesperadamente, e que o som da voz dele teria sido seu resgate, e que ela teria voltado atrás. Em vez disso, ele permaneceu num silêncio frio e honrado.

Ian McEwan

***

O MUNDO PÓS-ANIVERSÁRIO – O amor romântico é uma corda esticada e, em certos aspectos, uma luta, pois sempre nos debatemos, se não contra a pessoa amada em si, contra nossa própria escravização indigna a outro ser humano. Era possível que houvesse um tipo de amor diferente, uma vez empatado o cabo de guerra – um amor solto, generoso e seguro, um amor relaxante, tranquilo e descontraído, como quem se reclina com um copo de vodca-tônica e põe os pés para cima na balaustrada da varanda, depois de uma exaustiva tarde de esportes.

Lionel Shriver

***

ESTRANHAMENTO

Estranho
que depois dos 40
esteja aprendendo
o que é o amor.
Que tolo então eu era
achando
que já sabia tudo de cor
pensando
que nesta matéria
não sentiria mais dor
pois dor e alegria me abalam
e humilde
– reaprendo quem sou.

Talvez pensasse
já ter resolvido a questão
quando na adolescência
morto de amor
vivi a ressurreição.
Mas o amor revém
com seu mistério sobre um homem
que em breve
será velho. Revém
e me humilha. Me humilha
e glorifica
me deixa doce e perplexo
enquanto minha carne
se estremece
– e maravilha.

Affonso Romano de Sant’Anna

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CEM ANOS DE SOLIDÃO – A casa se encheu de amor. Aureliano o expressou em versos que não tinham princípio nem fim. Os escrevia nos ásperos pergaminhos que Melquíades lhe dava, nas paredes do banheiro, na pele dos seus braços e em todos aparecia Remédios transfigurada. Remédios no ar soporífero das duas da tarde, Remédios na calada respiração das rosas, Remédios na ampulheta secreta das traças, Remédios no vapor do pão ao amanhecer, Remédios em todos os lugares e Remédios para sempre’.

Gabriel García Márquez

***

AMOR EM MINÚSCULAS – Como além do mais o homem é viúvo, manda o menino a um internato da Inglaterra enquanto trabalha como correspondente na Itália. Com a distância, o garoto mitifica o pai e imagina que, na realidade, ele é um agente secreto e muitas coisas mais. Um dia, o diretor do internato o chama para lhe dar a notícia de que o pai havia morrido. Embora se apressasse a observar que não sofrera. O diretor não queria entrar em detalhes, mas, diante de sua insistência, lhe disse algo assim:

_ Foi um acidente muito estranho. Seu pai caminhava por Nápoles e passou debaixo de uma sacada no qual o dono da casa tinhas um porco. O animal estava muito gordo porque o haviam alimentado em excesso. Exatamente quando seu pai passava debaixo dele, a plataforma cedeu. Morreu esmagado no ato.

_ E o que aconteceu com o porco? _ perguntou o menino ao diretor, que se aborreceu pelo que lhe pareceu uma frivolidade e o mandou para o quarto.

Ao crescer o filho do jornalista torna-se melancólico e solitário. Admite que o pai não fora um espião, mas se nega a explicar como morrera, porque quando o fizera haviam rido dele. Carrega esse trauma em segredo como uma pedra. Um dia conhece uma garota e começa a sair com ela. Não lhe conta que o pai morreu, porque sabe que se rir nunca poderá casar com ela. Mas em uma visita à casa da tia do rapaz, ela vê a foto do pai e pergunta quem é. A tia lhe diz e conta que morreu em um acidente.

– Você nunca me contou isso – dia ela surpresa, a seu noivo.

– Pois lhe explicarei – intervém a tia. E ele começa a tremer. Quando a tia termina o relato do acidente, a menina pergunta:

– E o que aconteceu com o porco? Então se dá conta de que encontrara o amor da sua vida.

Francesc Miralles

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ENSAIOS DE AMOR – Um dos maiores inconvenientes do amor é que nos faz, pelo menos durante algum tempo, corrermos o risco de sermos realmente felizes.

Talvez a ideia de um amor sábio ou inteiramente indolor seja tão contraditória como a de uma batalha sem sangue.

Muitos amantes matam a sua própria história de amor só porque não conseguem suportar a incerteza ou o puro risco contidos na sua experiência de felicidade.

Alain de Botton

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BELA DO SENHOR – Na manhã seguinte, depois de se barbear melancolicamente, acendeu um cigarro a fim de renascer para o otimismo, obrigou-se a sorrir acreditando ter achado a solução. Sim, acabar de vez com essa vida social tão próxima que lhes lembrava sua solidão de banidos, murados no seu amor. Se tivessem uma casa só para eles, longe dos homens, não haveria mais o contraste, o apelo da vida de fora. Viveriam num mundo só deles, sem ver mais ninguém, não precisariam de ninguém. E ele transformaria essa casa num santuário onde lhe pudesse dar uma vida de amor perfeito. Absurdo, mas o amor estava servido e tinha de ser bebido, e o importante era fazê-la feliz, pensou ele.

Albert Cohen

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Textos convidados

Ao longo dos anos, pude confrontar as falhas e o que fiz ou deixei de fazer. E paro para pensar com medo, que não me acho capaz de amar. Devo ter vindo com defeito de fabricação na alma. Bem, se eu falasse que era no coração, seria clichê demais até pra mim! Porque amor, este, eu acho que não rola mais nessa vida. Sigo colecionando histórias. Até consigo rir delas. E se eu escrevesse “vida, acaba logo!” não seria uma nota suicida. Acredito em outras vidas. E lá, eu teria outra chance. Vamos lá, tudo de novo.

***

Você pode me dizer que é tudo um absurdo e eu concordo. Mas dentro desse teatro chamado vida, eu escolhi o amor. Eu perdi algumas coisas optando por dar ao amor romântico a direção da minha vida. Eu não me arrependo de nada, apenas tive surpresas demais. Sobre mim, eu posso te dizer: estar junto deles foi meu projeto mais ambicioso. Não existe outro caminho quando você acredita que tem tudo.

***

Não a pieguice de ter perdido mais um amor, mas a estranha, desconcertante e incomoda realidade de ser sem o amor. Não é a ausência de alguém, é a ausência do que vale.

***

Não dá respostas, só deixa espaço. É do que se trata. Espaço demais, lacuna demais. Chegar perto com tanta distância? Chegar ao amor com tanta reparação? Através de amores pequenos e foscos? Inacabados, mal resolvidos. Enquanto vividos parecem enormes. Quando acabam, mostram-se ínfimos. Que intensidade é essa tão efêmera? Paixão? Não, paixão deixa saudade, lembrança; amores pequenos deixam o nada.

***

Sexo no sábado. Amor a semana toda. Cabelo na cara, sol na barriga. Tatuagem. Cara amassada. Cheiro de pum. Ligação no meio do dia. Briga de noite. Chuveiro que pinga. Lençol novo na cama. Ar condicionado gelado. Barulhinho de risos. Abraço de urso. Confiança de um zoológico inteiro.

***

Esse amor fala palavrão, grita e se descabela. Em Português. À prova de bala, de bola. Com gosto de pão com manteiga. Não gosto de manteiga, mas sou louca por ele. E pelo seu amor.

 

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Nota do Apezinho: as fotos são da Juliana Rezende e do Marcos Serra Lima.

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1 comentário

  • RespondaNárgila Rochajunho 12, 2016 at 8:45 am

    Simplesmente amor… Simplesmente amei… Feliz Dia dos Namorados!

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